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UMA CARTA DE AMOR PARA VOCÊ

Dizem as boas línguas que a tecnologia aproxima as pessoas. Temos e-mail, Twitter, MSN, face book, Orkut, celular, webcam e o escambal. Tudo isso para ficarmos mais pertinho. O problema é: mais pertinho de quem cara pálida?

Estamos mais sós do que nunca nesse mundo de meu Deus. Cada um no seu PC.
O computador hoje em dia está substituindo a comunicação face a face. Somos siameses da mesma solidão. Estamos todos na rede. Juntos mais separados do que nunca.

Quero citar aqui um texto de Rubens Alves que li no livro de Margarida Maria Moura sobre a obra de Franz Boas:

“Uma carta de amor é um papel que liga duas solidões. A mulher está só. Se há outras pessoas na casa, ela os deixou. Bem pode ser que as coisas que nela estão escritas não sejam nenhum segredo, que possam ser contadas a todos. Mas para que a carta seja de amor, ela tem de ser lida em solidão. Como se o amante estivesse dizendo:
- Escrevo para que você fique sozinha .

É este ato de leitura solitária que estabelece a cumplicidade, pois foi da solidão que a carta nasceu. A carta de amor é objeto que o amante faz para tornar suportável o seu abandono. (...) Nada diz sobre o presente do amante distante. Daí sua dor. O amante que escreve alonga os seus braços para um momento que não mais existe. A carta de amor é um abraçar do vazio. (...) A carta é paciente (...). Uma carta contra o rosto – poderá haver coisa mais terna? Uma carta é uma mensagem. Mesmo antes de ser lida, ainda dentro do envelope fechado, tem a qualidade de um sacramento, presença sensível de uma felicidade invisível”

O mundo não escreve mais carta de amor.
Só um ridículo nunca escreveu uma carta de amor já dizia o poeta Álvaro de Campos:

Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)
Álvaro de Campos, 21-10-1935



Então, estamos vivendo num mundo ridículo. Frio como as teclas de um computador. Devassado pelo Google Earth. Fazendo sexo virtual (valei-me meu Jesus Cristinho amado). Aproximamos de nós cada vez mais o desconhecido, o alheio, o grande irmão.

Sinto saudades das cartas de amor. Sinto saudade de esperar por ela.Sinto saudades dos seres ridículos.

Hoje pessoas se relacionam pelo MSN – plin escreveu – plin – o outro já recebeu – plin o outro já respondeu – pli...plin...plin...plin...

Estamos agonizando. Vivendo cada vez mais rápido. Morrendo cada vez mais rápido. Claro que você caro leitor, inteligente como é, logo vai indagar: como assim, morremos cada vez mais rápido se hoje em dia o homem está vivendo mais? Bom, se você chama isso de vida, concordo.

É claro que sem toda esta tecnologia você não estaria lendo este texto agora. Realmente talvez não. Mas estaria lendo um livro, ou quem sabe uma poesia de Álvaro de Campos, que com certeza escreve bem melhor que eu.

É muito bom estar JUNTO de você de novo - desculpe a ousadia do gesto.

2 comentários:

Anônimo disse...

*CARTAS DE AMOR PERFUMADAS*
Oi, Markus!...
Realmente, concordo totalmente com você: estamos mais perto e ao mesmo tempo täo longe dos outros...
E tem coisa mais romântica do que uma carta de amor? Graças a Deus que eu sou do tempo delas, pois näo só escrevi muitas como também recebi: uma emoçäo indescritível! Mas, a moçada de hoje escreve cartas de amor virtuais, aliás, o amor também costuma ser virtual.
Um e-mail de amor... Tem graça isso? Pelo amor de Deus! E como se perfuma um e-mail de amor? E a flor seca colocada no meio da carta dobrada?...
Será que esta é mais uma prova de que o romantismo está realmente agonizando? A turma hoje prefere ir direto "al grano", como se diz em "Español" - näo é mais preciso tocar primeiro o coraçäo com cartas de amor, nem mesmo a uma distância grande, pois, o e-mail com a sua praticidade, simplifica tudo, até o idioma...já há uma espécie de "Virtualês", muito usado entre a galera...
Pense só: uma carta de amor sem perfume, sem uma rosa seca, curta, direta e objetiva, esrita em em "Virtualês"...!
Beijos e abraços...virtuais!
BIA.

Anônimo disse...

Meu irmão...

Quando inventaram o E-MAIL, O MSN e o resto, a IDÉIA era essa, aproximar as pessoas mesmo em um mundo de relatórios, planilhas, gráficos e powerpoints... mas aí deu no que deu!

Lembro que nas primeiras "propagandas" (na verdade eram virais e nem sabiam ainda) do MSN, os textos na telinha do programa eram sempre "A GENTE SE ENCONTRA ENTÃO LÁ NO BAR." ou "ENTÃO TÁ COMBINADO: AS 20h NA SUA CASA!"... ou ainda "NÃO VEJO A HORA DE OUVIR TUDO ISSO OLHANDO PARA A SUA BOCA!!". Esse mesmo provocou muitas paudurecências... e vai ver foi por isso que inventaram o WEBCAN pra cortar MESMO a possibilidade do encontro real acontecer! Cruzes!!!

E aí deu no que deu e "VC SB O REST".

Lí em algum lugar a crônica de não sei quem (viu como também sou bom de referência!) que falava sobre a linguagem cada vez mais "simplificada" que cresce e se espalha dia-a-dia na comunicação on-line e popular. O texto alertava que em breve estaremos nos teleportando para Marte, mas nos comunicando com grunhidos paleolíticos, cada um no seu quadrado isolado!

UGA!!!

Valter Schueler